"MULHERES IMPERIAIS E SEUS DESTINOS" - Palestra completa impressa
"Mulheres Imperiais e Seus Destinos" foi o tema da palestra proferida pela jornalista, professora e pesquisadora, Zélia Sell, no Centro de Letras do Paraná, dia14 de agosto de 2018, a qual disponibilizamos hoje a todos, de forma impressa, para fins de registro histórico e pesquisa.
Família Romanov, da Rússia
Zélia Maria Nascimento Sell é a terceira filha de Ney Regattieri Nascimento e Luíza Grein Nascimento, casada com Luiz Carlos Rambusch Sell e mãe de 3 filhos.
Formou-se em Magistério no Colégio Sion, Jornalismo na UFPR e pós-graduou-se em Administração pela PUC-Paraná.
Concluiu os cursos de Inglês no Centro Cultural Brasil- Estados Unidos, especializando-se em Tradução na UFPR e Francês na Alliance Française. Trabalhou em diversos jornais, revistas e por 14 anos produziu e apresentou o programa "Nossa História" na Rádio Educativa do Paraná. Recebeu inúmeros prêmios e comendas, inclusive da UNESCO. É membro efetiva do Instituto Histórico e do Centro de Letras do Paraná.
Zelia Maria Nascimento Sell
A palestrante discorreu sobre a importância de dona Leopoldina, a arquiduquesa austríaca que trouxe cultura e requinte à corte brasileira, além de ter sido figura fundamental na independência do Brasil, assim como de dona Isabel, A Redentora, sua mãe, Teresa Cristina e dos laços da corte europeia com a família real brasileira.
Abordou, também, as últimas pesquisas sobre Anastácia, a integrante da família Romanov, da Rússia, desaparecida do massacre pelos bolcheviques, fato histórico que completou seu centenário no dia 17 de julho de 2018.
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O CENTENÁRIO DO MASSACRE DOS ROMANOV
(por Zélia Maria Nascimento Sell)
Há cem anos o último czar da Rússia desapareceu com toda sua família e quatro assessores em circunstâncias consideradas suspeitas e que até hoje são objeto de controvérsia.
Na madrugada de 17 de julho de 1918 Nicolau II, 50 anos,a czarina Alexandra , 46 anos,as filhas Olga, 22, Tatiana, 21, Maria , 19, Anastácia , 17 e o filho Alexei , 13 e mais o médico da família, Dr.Botkin, o valete de Nicolau, Trupp, a criada de Alexandra, Demidova e o cozinheiro Kharitonov foram executados pelos bolcheviques.
Eles estavam mantidos em prisão domiciliar na Casa Ipatiev, residência particular em Ecaterimburgo, nos Montes Urais. Levados ao porão com a desculpa de fazer uma foto, foram surpreendidos com a ordem de execução, lida pelo líder revolucionárioYakov Yurovski. A czarina Alexandra e a filha mais velha, Olga, colocaram-se à frente do czar para protegê-lo, mas todos foram alvejados por onze atiradores.
Nicolau, estupefato, tentou fazer uma pergunta, e Yurovski teria (segundo o historiador britânico Robert Sernic em “The Last Of Tsars “- 2017),repetido a declaração e gritado "_Fogo!”.
Em meio à fumaça, depois de dois minutos de tiroteio, alguns ainda sobreviveram: as mulheres e a cozinheira, que carregavam as jóias da família costuradas em suas roupas íntimas e em uma almofada. As balas ricochetearam, e o trabalho foi concluído a golpes de baionetas.
Os corpos foram despidos e jogados em uma vala comum nos arredores de Ecaterimburgo, e depois queimados.
Ali ficaram até serem encontrados por historiadores em 1970, mas o fato só foi divulgado publicamente depois do colapso da União Soviética.
Em julho de 1991 nove esqueletos foram exumados de uma cova rasa perto de Ecaterimburgo, na Sibéria, a pouca distância do porão onde o último czar tinha sido assassinado com a família há setenta anos antes.
Mas onde estariam os ossos dos dois mais jovens, Alexei e Anastácia, mortos junto com a família?
Na trama para esta descoberta estão o secretário de estado dos EUA, James Baker, o presidente da Rússia Boris Ieltsin e o príncipe Philippe da Inglaterra.
Uma acirrada disputa entre cientistas russos e norte-americanos inclui o Dr. William Maples e Michael Baden, além de cientistas especializados em DNA na Rússia, EUA e Inglaterra.
A identificação das ossadas só foi feita em 1998, e os restos mortais levados com grande pompa à cripta da catedral de São Pedro e São Paulo, em São Petersburgo. “Foi uma das páginas mais vergonhosas de nossa história”, comentou o então presidente Boris Yeltsin.
Os supostos restos mortais do czarevich Alexei e de uma de suas irmãs encontrados em 2007 ainda não foram enterrados e permanecem no arquivo do Estado, pois a Igreja tem dúvidas sobre a identidade.
Durante anos surgiram lendas de sobreviventes e pretendentes que reclamaram a herança na Europa e na Russia.Em janeiro de 2011 a justiça russa encerrou pela segunda vez a investigação sobre a execução do czar, dizendo que ‘não há documento confiável que prove ter sido Lênin o instigador do massacre”, mas que, “no entanto, quando soube que a família estava morta, aprovou”.
TESTES DE D.N.A
Testes de DNA reaalizados de 1993 a 1995 nos Estados Unidos, Reino Unido e Russia, identificaram a czarina Alexandra com a ajuda do Príncipe Philippe, Duque de Edimburgo, marido da rainha Elisabeth, que disponibilizou seu DNA.. Ele é filho da princesa.Alice de Battemberg, irmã mais velha da czarina, e neto da rainha Vitória.
Isto só foi possível graças ao .DNA mitocondrial, formado na mitocôndria da célula, que é transmitido apenas pelas mulheres, mas aparece nos homens.
Em 11 de julho de 1991 foram exumados os ossos encontrados no Bosque Koptyaki porAlexander Avdonin e Geli Ryabov em fins dos anos 70. Foram identificados 9 esqueletos de 4 homens e 5 mulheres. Mas infelizmente a investigação coincidiu com a estagnação de Leonid Brejnev, que liderou a União Soviética de 1964 a 1982. Reenterraram, então os ossos que lá ficaram até a queda do regime.
O czarevich Alexei, que era hemofílico e sofria muito com a doença teria sido poupado?
Por anos um cidadão carismático adornou a sociedade de Scottsdale, no Arizona, usando o nome de Alexei Nikolaevich Romanov, e ‘as pessoas queriam acreditar naquela lenda’.
As lendas surgiram pela desinformação durante o governo Lênin de que Nicolau foi morto, mas a mulher e os filhos poupados...
Outra versão dizia que estariam na Polônia , onde filhas e filho ‘reapareciam’ em diferentes tempos e lugares, e que de lá , onde ‘ se misturavam entre os nativos, pelos traços parecidos’, o czar teria enviado Anastácia para a América afim de retirar de um banco em Detroit grande quantia em dinheiro.
Depois da guerra com o Japão, em 1905, o czar teria depositado muito dinheiro em países ocidentais , Nova York,Londres, Paris e Berlim.
Somente nos EUA seriam 400 milhões de dólares.
Goloniewicz, desertor do governo polonês , prestou serviços para a CIA até 1964, quando foi aposentado e passou a receber uma pensão do governo americano. Segundo o New York Times ele ‘teria sido o agente mais produtivo que a CIA já teve”.
ANNA ANDERSON
Às nove da noite do dia 17 de fevereiro de 1920, dezenove meses depois dos assassinatos, uma jovem pulou de uma ponte de seis metros de altura sobre o Canal Landwehr, em Berlim. Um policial viu, salvou-a e levou para o hospital. Sem bolsa, documentos, nada, ela se recusava a falar. Somente depois foi levada ao Dalldorf Mental Asylum,como “Fauleun Unberkannt” – a mulher que não quer falar – e colocada numa enfermaria com 14 mulheres.
Tinha altura de 1,58 e pesava 50 quilos. O corpo era coberto de cicatrizes e ela não era mais virgem.
Os dentes estavam em péssimas condições e sete foram extraídos. Após meses de silêncio ela começou a falar com enfermeiras e uma delas comentou que ‘ela falava russo como uma nativa’. Ao folhear uma revista com fotos da família imperial russa ela comentou que era Anastácia.
No fim de maio de 1822 ela foi morar com um barão russo do Báltico e sua esposa. Segundo contou, após o massacre, quando os corpos da família eram carregados para fora do porão ,um soldado notou que, embora desacordada, ela não estava morta. Ele seria o polonês Alexandor Tchaicovsky, que , ajudado pelo irmão Sergei a teria levado para sua casa em Ecaterimburgo de onde teriam fugido em uma carroça com a mãe e a irmã.
Quatro meses e 3 mil quilômetros depois cruzaram a fronteira com a Romênia e se instalaram em Bucareste, onde a jovem se descobriu grávida. Supostamente Tchaicowsky a teria estuprado. Ela teve a criança, colocada em um orfanato e Tchacovsky teria morrido logo depois, em uma briga de rua.
A jovem relatou que foi a Berlim pedir ajuda à irmã da imperatriz Alexandra, Irene de Prússia, sua madrinha, mas defronte aos portões viu que não seria reconhecida e ficou desesperada, se atirando no canal.
Membros da antiga família imperial germânica apareceram para reconhecê-la e ficaram impressionados com a semelhança com Anastácia.
O inglês que ela falava também era igual ao da família imperial, pois a mãe, Alexandra, tinha sido educada na Inglaterra pela avó, a rainha Vitória.
O príncipe Sigismund, da Prússia, filho da princesa Irene, enviou um questionário de 18 perguntas para Anna responder e ficou convencido de que ela era Anastácia da Rússia.
Até o kaiser Wilhelm II, exilado na Holanda, mandou a segunda esposa , Hermine, visitá-la, e seu silêncio foi entendido como aprovação.
Inicia-se uma briga de família entre os 44 Romanov vivos e 12 deles assinam um documento negando que Anna Anderson seria Anastácia.
Mas a revelação por Anna da viagem do “tio Ernie”, general alemão parente da czarina no comando das tropas ocidentais à Rússia para tentar com o kaiser um acordo –o que era um segredo de família- mais uma vez reacende a certeza de ela ser o esqueleto que faltava na cova.
Mas os parentes do Kaiser proíbem até o Príncipe Waldemar da Dinamarca de pagar as contas dos hospitais e sanatórios por onde Anna andou.
O embaixador dinamarquês na Alemanha Herlauf Zahle declarou que “não podia fazer mais nada se a família imperial russa desejava que um dos seus membros morresse na sarjeta”.
Então o duque Jorge de Leuchtemberg , proprietário de um castelo em Seccon, na Alta Baviera, e parente dos Romanov, assegurou o sotaque de Anna.
Mas ela teve mais um ataque e foi internada no Four Winds Sanatorium, em Nova York.
A princesa Xenia, a mais velha das tias Romanov, convidou então a prima para viver com ela.
O filho mais novo do médico da família morto no massacre imperial , Gleb Botkin, revela então haver uma fortuna no Bank Of England, milhões de rublos em ouro czarista depositado para o dote das filhas Romanov.
Em 7 de outubro de 1935 o advogado americano Edward Fallows escreve para o então chanceler alemão Adolf Hitler dizendo que, ‘por milagre, Anna escapou de Yurovski e de outros que assassinaram sua família ‘, mas não obtém nenhuma resposta.
Follows monta, então, em Delaware, a corporação GRANDANOR (Grand Duchess Anastacia Nicolaievna Of Russia) , com muitos investidores.
Hallows faleceu em 1940 , e em 1955 a amiga íntima da imperatriz Alexandra, Lily Dehen,depôs sob juramento que “Alexandra havia confirmado a fortuna no Banco de Londres”.
Mas há os que dizem que ‘ durante a I Guerra Nicolau II trouxe o dinheiro para casa e gastou em hospitais e trens- hospitais.
O Baring Brothers Bank não negou que durante 70 anos guardou milhões de libras em dinheiro russo e que em 7 de novembro de 1917, quando os bolchevique tomaram o poder, o governo britânico congelou milhões de libras depositadas no Baring Brothers pelo governo imperial.
Em julho de 1986 na era da Glasnot e Perestroika, os governos de Gorbachev e Thatcher decidiram esquecer o passado e usar esse dinheiro para indenizar portadores britânicos de títulos da Rússia Imperial e pessoas que haviam perdido propriedades na Revolução.
PROVAS CIENTÍFICAS
O caso Anna Anderson foi a ação judicial mais longa dos tribunais alemães do século XX. Começou em 1938 quando ela contestou a distribuição de uma propriedade entre os parentes alemães da imperatriz Alexandra , foi suspendo durante a II Guerra e reaberto nos anos 50-60 e finalmente concluído nos anos 70 com a rejeição de seu recurso pelo tribunal alemão. A oposição partiu da Casa de Hesse.
O apoio financeiro veio do tio do marido da rainha Elisabeth II, o príncipe Philippe. Sua mãe, a princesa Vitória de Battemberg, era irmã da imperatriz Alexandra, e a Princesa Irene da Prussia, sua tia.
Mas foram os testemunhos baseados na Medicina e na Ciência que apoiaram a reivindicação de Anna Anderson.
O DR. Otto Reche, antropólogo e arqueólogo de fama internacional, fotografou Anna mais de 100 vezes, comparando com fotos de Anastácia e concluiu que ‘ milímetro por milímetro a coincidência entre essas duas faces humanas não é possível a não ser que sejam gêmeas idênticas.’
Minna Becker, que autentificou o Diário de Anne Frank, comparou centenas de caligrafias da Grã-Duquesa e de Anna Anderson , e após 34 anos de estudou declarou que eram a mesma pessoa.
O Dr. Moritz Hurtmayer, especialista forense alemão, criou um sistema de mapeamento do crânio –impressões cranianas – das quais não há duas iguais no mundo e provou que tecidos da orelha direita e pontos anatômicos de Anna e Anastácia eram idênticos.
Oito mil páginas de depoimentos foram encadernados em 49 volumes, mas o veredicto judicial final ainda foi inconclusivo.
Anna declarou que ‘ não precisava provar nada para o mundo, que sabia quem era ‘e se fechou sozinha com 60 gatos.
Em 1968 se casou com Johann Manaham, um solteirão da Virginia e viveram juntos por mais de 15 anos em Charlotsville. Ela o chamava de Hans e ele a chamava de Anastácia.
Certa vez .elç comentou que Anna estava sob a vigilância da CIA, KGB e Serviço Secreto Britânico.
Ela contou que durante o massacre toda a família imperial, exceto o czar, teria sido estuprada, e tinham assistido uns aos outros sendo violados.
Em novembro de 1983 Anna foi internada em um asilo de onde o marido a seqüestrou e saíram de carro pelas estradas secundárias da Virginia parando para comer em lojas de conveniências.
Um alerta da polícia capturou-os e ela foi levada de volta ao hospital psiquiátrico.
Três meses depois, em 12 de fevereiro de 1984, Anastácia morreu de pneumonia.
Seu corpo foi cremado no Castelo Seccon e o marido, Manahan, morreu seis anos depois.
A imagem de Nicolau II e família está presente hoje na catedral do Sangue Derramado em Ecaterimburgo, Rússia, que foi erigida no local da execução.
A Igreja Ortodoxa Russa declarou no ano 2000, como ‘santos’, Nicolau II, sua esposa Alessandra e os cinco filhos executados em 1918.
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"A tradição é para os povos como a experiência da vida para os indivíduos. Se estes esquecem o seu passado, perde-se a consciência de sua existência, tendem a anular-se ou, quando menos, a repetir os mesmos erros já cometidos, porque o farol com que os indivíduos se conduzem é a experiência da vida armazenada da memória". (In "Pensamento de todos os tempos", de Jeorling J. Cordeiro Cleve).